sábado, 18 de julho de 2015

759 - O homem que soluçava

No início da década de 1980, havia um personagem obscuro dos desenhos animados chamado de Mr. Hiccup (Sr. Soluço). Um homem pequeno e verde, que usava uma gravata e um chapéu de feltro, o Sr. Soluço, que tinha uma "vida normal, um emprego normal, e uma casa normal," mas sofria de um problema "não tão normal": apesar de seus esforços sinceros, ao longo de 39 episódios, ele não conseguia parar de soluçar.
Não obstante o Sr. Soluço ser bem-humorado e alegre, a difícil situação desse personagem fictício é um problema muito real: os médicos estimam que, em um dado momento, cerca de 1.000 pessoas nos Estados Unidos estão a sofrer do intolerável inferno dos soluços crônicos.
Conhecido cientificamente como "flutter diafragmático sincrônico", os soluços são contrações espasmódicas involuntárias que ocorrem no diafragma, resultando em um rápido e sucessivo fechamento das cordas vocais. Normalmente desencadeados pelo aumento da pressão abdominal, os soluços são uma aflição que todos nós já enfrentamos em nossas vidas - mas, na grande maioria das vezes, eles vão embora, naturalmente, depois de uma ou duas horas. Quando soluços duram mais do que alguns dias, eles são considerados "persistentes" e quando perduram além de um mês, crônicos. Não há cura medicamentosa para eles.
O mais longo caso registrado na história da medicina pode ser creditado a Charles Osborne, um agricultor que soluçou continuamente por 68 anos.
Nascido em uma fazenda de Iowa, em 1893, Osborne passou sua juventude e a maioria de seus anos de adulto, trabalhando como camponês na propriedade de seu pai. Em uma fatídica tarde de primavera em 1922, a sua vida deu uma guinada para pior.
Quando pendurava um porco de 350 libras para matar, ele teve um desmaio. Ao recuperar-se do desmaio, uma grave crise de soluços iniciou-se nele, e nenhum remédio caseiro conseguia aliviá-lo. Como o Sr. Soluço, ele tentou todos os velhos truques - beber um copo de água mordendo um lápis, engasgar-se com uma colher de açúcar, respirar em um saco de papel etc. - mas suas contrações diafragmáticas persistiam a uma taxa constante. Os dias de soluços tornaram-se semanas e as semanas, meses; eventualmente, o agricultor voltava a trabalhar.
Nos 68 anos seguintes, Osborne soluçou continuamente a uma taxa de um soluço a cada três segundos durante as horas de vigília. Médicos que estudaram o caso estimam que ele soluçou 24.000 vezes por dia, ou cerca de 595.680.000 vezes durante a vida.
Nos primeiros anos, Osborne procurou orientação médica, chegando a viajar até o Alasca para se encontrar com médicos. Isso tornou-se muito dispendioso e, depois de centenas de "curas potenciais" fracassadas, ele aceitou os soluços como um complemento indesejado à sua vida cotidiana. Em sua busca pela cura, Osbourne conseguiu atingir um certo grau de fama: ele fez uma aparição no programa Ripley's Believe It or Not, foi entrevistado por Johnny Carson, no The Tonight Show, e garantiu um lugar no Guinness Book of World Records para o "maior ataque de soluços".
Ao longo dos anos, ele recebeu cerca de 4.000 cartas oferecendo simpatias e remédios que não funcionavam. E passou a rejeitar cada sugestão recebida com um curto "tentei isso".
O único e fugaz momento de consolo para Osborne veio no final de 1970, quando um especialista em Illinois diagnosticou que ele tinha "uma pequena área no tronco cerebral destruída, inibindo a resposta soluço." Ele foi então colocado sob uma droga experimental, um hormônio que o livrou dos soluços por 36 horas, mas que, depois de apresentar alguns efeitos colaterais igualmente intoleráveis, ele se recusou a continuar o tratamento.
Aos poucos, ele aprendeu a dominar o barulho de seus soluços, aplicando técnicas de respiração em sua rotina diária; embora os soluços diminuíssem quando ele estava dormindo, eles imediatamente retornavam quando ele acordava todas as manhãs. Era obrigado a liquidificar os alimentos sólidos para evitar a asfixia.
Apesar desses inconvenientes, Osbourne viveu o que ele considerava ser uma vida relativamente "normal". Ele continuou trabalhando com suínos por muitos anos, casou-se duas vezes e foi pai de oito filhos.
Misteriosamente, os soluços de Osborne cessaram em 1990. Mas, um ano mais tarde, com a idade de 97 anos, ele faleceu devido a causas naturais.
Depois que Osborne morreu, vários outros casos de soluços crônicos vieram à tona na mídia, nomeadamente o calvário de inglês Christopher Sands, em 2006. Por mais de três anos, Sands, um músico e vocalista, experimentou um ataque contínuo de soluços tão severos que ele, muitas vezes, desmaiava por falta de oxigênio para o cérebro. Ele só curou quando uma equipe de médicos encontrou e removeu o culpado: um tumor em seu tronco cerebral.
Osborne e Sands tiveram, na realidade, alguma sorte. Soluços crônicos têm, em alguns casos documentados, levado a uma perda de peso severa e à morte por exaustão de seus portadores.
Apesar dos avanços médicos, publica o Jornal de Ciência Dartmouth , "os soluços são um assunto minimamente estudados, e existem apenas especulações a respeito de porque nós soluçamos com tudo". A única solução documentada para os casos crônicos é a cirurgia para cortar os nervos que controlam o diafragma (frenicectomia), mas isso quase sempre resulta em uma respiração severamente prejudicada. Para aquelas almas infelizes que compartilham a experiência de Osborne, há pouca esperança de uma recuperação completa.
Enquanto todo mundo tem sua própria teoria sobre como acabar com os soluços, essas "curas" são, em última análise coincidência, diz Dr. Terence Anthoney, o homem que tratou Osborne mais de 40 anos atrás.
The Man Who Continuously Hiccuped for 68 Years, Priceonomicus

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